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Livros. Notícias. Rumores. Apontamentos.

Um poema de Ruy Belo

 

ALGUMAS PROPOSIÇÕES COM CRIANÇAS

A criança está completamente imersa na infância
a criança não sabe que há-de fazer da infância
a criança coincide com a infância
a criança deixa-se invadir pela infância como pelo sono
deixa cair a cabeça e voga na infância
a criança mergulha na infância como no
mar
a infância é o elemento da criança como a água
é o elemento próprio do peixe
a criança não sabe que pertence à terra
a sabedoria da criança é não saber que morre
a criança morre na adolescência
Se foste criança diz me a cor do teu país
Eu te digo que o meu era da cor do bibe
e tinha o tamanho de um pau de giz
Naquele tempo tudo acontecia pela primeira vez
Ainda hoje trago os cheiros no nariz
Senhor que a minha vida seja permitir a infância
embora numa mais eu saiba como ela se diz

Ruy Belo, Todos os Poemas I, ed. Assírio & Alvim 

Um poema de Fernando Assis Pacheco

SEM QUE SOUBESSES 

 

Falei de ti com as palavras mais limpas,

viajei, sem que soubesses, no teu interior. 

Fiz-me degrau para pisares, mesa para comeres,

tropeçavas em mim e eu era uma sombra 

ali posta para não reparares em mim. 

 

Andei pelas praças anunciando o teu nome,

chamei-te barco, flor, incêncio, madrugada. 

Em tudo o mais usei da parcimónia

a que me forçava aquele ardor exclusivo. 

 

Hoje os versos são para entenderes. 

Reparto contigo um óleo inesgotável

que trouxe escondido aceso na minha lâmpada 

brilhando, sem que soubesses, por tudo o que fazias. 

 

Fernando Assis Pacheco, in A Musa Irregular, ed. Assírio & Alvim 

Um poema de Inês Dias

A MINHA PRIMEIRA HISTÓRIA DE PORTUGAL

Para o meu pai

Sabes bem que sempre preferi os sonhadores
e os derrotados, tal como nunca deixei de
escolher as canções mais tristes.
Saltava as páginas em que se tomavam
castelos e cobiçavam praças estranhas
para me poder sentar esquecida
à volta de uma fogueira,
vendo um irmão ser traído,
um exército desejar a morte
por uma visão. Do pinhal de Leiria
ficou-me apenas o sobressalto
do vento perdido entre as árvores,
o aroma ainda distante da canela
que, anos mais tarde, sentiria
noutro poeta. E tanto ouro do Brasil
assombrou-me as noites com pesadelos
de mármore e talha que nem a nossa armada
de papel conseguia vencer.

 

Hoje em dia, Sebastião é o vagabundo
mais fiel do meu jardim. Todas as tardes
adormece sobre a relva, numa real
indiferença aos pássaros que o saúdam
ou à beleza das romãzeiras que insistem em ungi-lo
de flores à falta de nevoeiro.
Gosto de reis assim, cujo túmulo
possa procurar em todas as capelas
de uma catedral estrangeira, acendendo
vela por vela até o encontrar para ti;
e sobretudo de D. Miguel, com quem
me cruzei na Nazaré quando fugia
de um milagre que não conseguia ver,
todo o mar do império cavado à minha frente.
Os meus passos não se marcaram
na rocha, nem a figura do rei-arcanjo
recuperou esses contornos apagados à força
na pedra do forte. Mas fizemos um pacto -

doravante o olhar de um sustém
o outro sobre a terra. É só essa
a nossa história.

 

Inês Dias, in Da Capo, ed. Averno

 

Um poema de Luís Miguel Nava

AO MÍNIMO CLARÃO

 

Talvez seja melhor não nos voltarmos

a ver, ao mínimo clarão 

das mãos a pele se desavém com a memória.

As mãos são de qualquer corpo a coroa. 

 

Das dele já nem sequer o itinerário

sei hoje muito bem, onde o horizonte

se desata o mar agora

regressa ao coração de que faz parte. 

 

Ainda é o mar contudo o que se vê

florir onde ele chegar. Chamando a esse

rapaz rebentação, 

o céu rasga-se à volta dos seus ombros. 

 

Luós Miguel Nava, in Como Alguém Disse, Contexto Editora 

Um poema de Luís Filipe Parrado

O QUE MAIS AMO

Não sou capaz de estranhas paixões
e amo, como muitos, o vento forte
que agita a roupa estendida nas cordas,
as bicicletas ferrugentas
de pneus furados
esquecidas em garagens e arrecadações,
a água fresca que mata a sede
ao mais miserável dos homens.
Mas se, como outros, amo os dias de intensa luz
e o descuido dos pássaros no ar,
ninguém ama como eu
as estrias do teu ventre,
a primeira casa de dois filhos.
de todas as coisas prodigiosas que conheço
são elas o que mais se parece
com os rasgos abertos por um arado
na terra crua deste mundo.

 

Luís Filipe Parrado, in Entre a Carne e o Osso, ed. Língua Morta 

 

Um poema de Margarida Ferra

ESCREVE SEMPRE QUE PRECISARES 

 

Escreve sempre que precisares de me dizer
que há gelo nas tuas mãos e nas paredes do frigorífico.
Os legumes que trouxe ontem
não sobrevivem a mais do que uma geada,
muito menos nós.


Escreve sempre que precisares, podes
dizer-me outra vez que nunca houve inverno,
que este ano não há verão,
que estamos aqui e não estamos porque não sabemos
se somos nós ou se somos aquelas
quatro pessoas que vão à rua

 

agora que encontraram a porta certa.

 

Escreve sempre que precisares, faz
uma lista de compras, uma lista de desejos,
anota todos os pedidos que deixaste
em poemas atrasados.
Escreve sempre que precisares
de mais um postal com selo e carimbo.
Escreve sempre que riscares
na tua agenda mais uma morada.

 

Sempre que eu precisar vais devolver-me
uma caligrafia rebuscada que não é a tua,
curvas a mais que não fazias na letra d.
Já não há desses manuscritos,
só eu e os carteiros aprendemos a decifrá-los
(e toda a gente sabe que nem isso é verdade).
Vai escrevendo. Sempre que eu precisar,
as frases podem desviar deixas decoradas,
repetidas como mentiras,
demasiado gastas para serem inócuas.

 

Escreve em vez de costurares.
Mesmo que soubesses, não há remendos suficientes,
arranhaste sem possibilidade de cura joelhos,
cotovelos e as canelas
(dançar sempre foi um antídoto fora do teu alcance).
Escreve que eu vejo nas tuas as minhas quedas,
os meus soluços nessas curvas
a mais que não fazes na letra d:
as tuas linhas são rectas, verticais e justas,
as minhas letras são apenas caracteres.

 

Escreve sempre que puderes
só em vez de apenas,
recursos humanos em vez de
resíduos urbanos. Talvez sejamos mais
do que pessoas, temos tamanhos diferentes
e não servimos nos lugares que nos foram destinados.

 

Escreve sempre que precisares de uma porta
onde caibas,
nunca trago chaves comigo.

 

Margarida Ferra, in Sorte de Principiante, ed. & Etc

 
 

Um poema de Daniel Faria

 

Sabes leitor, que estamos ambos na mesma página
E aproveito o facto de teres chegado agora
Para te explicar como vejo o crescer de uma magnólia.
A magnólia cresce na terra que pisas - podes pensar
Que te digo alguma coisa não necessária, mas podia ter-te dito, acredita,
Que a magnólia te cresce como um livro entre as mãos. Ou melhor,
Que a magnólia - e essa é a verdade - cresce sempre
Apesar de nós.
Esta raiz para a palavra que ela lançou no poema
Pode bem significar que no ramo que ficar desse lado
A flor que se abrir é já um pouco de ti, e a flor que te estendo,
Mesmo que a recuses
Nunca a poderei conhecer, nem jamais, por muito que a ame,
A colherei.

A magnólia estende contra a minha escrita a tua sombra
E eu toco na sombra da magnólia como se pegasse na tua mão.

 

Daniel Faria, in Poesia,  ed. Quasi  

Um poema de Miguel Martins

 

ALDEIA 
 
Adoro as levadas caudalosas serpenteando por entre avencas, levando consigo pequenos blocos de terra, ensopando a terra, matando a sede a raízes que mais parecem teias de aranha cujo centro se esconde a vários palmos de distância ou longilíneas tarântulas
 
Adoro os verões iniciáticos, a aprendizagem de caminhos e trabalhos sob as copas densas, os banhos na represa por entre libélulas e alfaiates e o esgar de nojo quando, da ponte, se avista lá ao fundo um gato morto preso nas silvas das margens de água límpida
 
Adoro os invernos laboriosos, as encostas escorregadias, a lama nas botas, a misteriosa caminhada até cada courela, o gesto medieval que ceifa o talo à couve, o toucinho na salgadeira
 
Adoro o regresso do ruído, a chegada das crianças da cidade, adoro vê-las subir às amoreiras, as mãos miúdas confiando em nós de madeira centenária, enquanto os pais me visitam na adega, cortamos uma broa e abrimos uma garrafa de morangueiro fresco
 
Adoro as casulas e os paramentos na sacristia e o pó que os cobre nos meses de ausência do padre e o branco nu da capela e a pedra nua de todas as outras casas, que é da cor das folhas de tabaco secas da plantação que o Eduardo tem ao fundo do povo e esconde dos fiscais (ele que já viu mais mundo que todos os fiscais da região e trabalhou na PanAm e foi aos Estados Unidos)
 
Adoro as trutas apanhadas à mão e o viveiro de trutas, nossa única indústria desde que ruiu o moinho de água e só Deus sabe quanto isso me custou e custa, saber que não mais sentirei o cheiro do milho acabado de moer
 
Adoro as idas à mercearia da aldeia vizinha e a pouquíssima variedade de produtos que aí se encontra, como se estivéssemos em tempo de guerra ou o século XX não ousasse começar por aqui
 
Adoro os fogões a lenha, as enormes arcas de nogueira, os colchões de palha de milho confortavelmente concavados por décadas de hóspedes e a remota possibilidade de serem do tempo em que João Brandão, “o terror das Beiras”, se acoitou nestas casas
 
Adoro os audazes mergulhos da ponte metálica coberta de caganitas de cabra e as cabras e a mão desusada que as conduz e que sabe amar quando é chegada a noite ou quando é chamada a iluminar um recanto de sombra
 
Adoro as lamparinas e os morcegos que vêm chupar o azeite das torcidas, o cheiro das queimadas e o cheiro do tojo acabado de roçar, e as pequenas manchas roxas que as amoras esmagadas imprimem no chão
 
Adoro as ameaças e as benesses do céu e a certeza de que nelas se escondem todas as respostas da irrevogável vontade de Deus e adoro como uns são pais dos filhos dos outros e deixam Deus fora da questão e não pegam em espingardas
 
Sim, adoro esta aldeia sem caçadores em que os pardais só temem os espantalhos e os gritos que ecoam desde o outro lado das montanhas
 
Adoro o tio Alfredo, que espantava as almas penadas batendo com uma corda nas costas, e o primo Alfredo que trabalha tanto como quem trabalha mais e mimetiza o mesmo gesto para afugentar as dores que isso lhe dá por todo o corpo
 
Adoro a iniciação sexual dos rapazes, quase sempre com outros rapazes, anos antes de terem uma rapariga, o que só acontece aos doze anos e depois não quer dizer nada, que é como quem diz, fica vida fora
 
Adoro o orvalho desenhando folhas de plantas nos vidros das janelas e janelas nas folhas das plantas e a nitidez de todos os veios destas e de todas as veias na pele das mulheres, que nunca tomaram banhos de sol e sempre cobrem as cabeças com lenços ou chapéus de palha
 
 
E adoro-vos a vós que nunca vistes nem vereis a minha aldeia e acabais de a adotar pelo útero
 
 
Miguel Martins, Clube dos Poetas Vivos, Lisboa, 2002

José de Almada Negreiros - A Invenção do Dia Claro (excerto)

O LIVRO

 

Entrei numa livraria. Pus-me a contar os livros que há para ler e os anos

que terei de vida. Não chegam, não duro nem para metade da livraria.

Deve certamente haver outras maneiras de se salvar uma pessoa, senão

estou perdido.

No entanto, as pessoas que entravam na livraria estavam todas muito

bem vestidas de quem precisa salvar-se.

 

*

* *

 

Comprei um livro de filosofia. Filosofia é a ciência que trata da vida;

era justamente do que eu necessitava — pôr ciência na minha vida.

Li o livro de filosofia, não ganhei nada, Mãe! não ganhei nada.

Disseram-me que era necessário estar já iniciado, ora eu só tenho uma

iniciação, é esta de ter sido posto neste mundo à imagem e semelhança de

Deus. Não basta?

 

*

* *

 

Imaginava eu que havia tratados da vida das pessoas, como há tratados

da vida das plantas, com tudo tão bem explicado, assim parecidos com o

tratamento que há para os animais domésticos, não é? Como os cavalos tão

bem feitos que há!

Imaginava eu que havia um livro para as pessoas, como há hóstias para

cuidar da febre. Um livro com tanta certeza como uma hóstia. Um livro

pequenino, com duas páginas, como uma hóstia. Um livro que dissesse

tudo, claro e depressa, como um cartaz, com a morada e o dia.

 

*

* *

 

Não achas, Mãe? Por exemplo. Há um cão vadio, sujo e com fome,

cuida-se deste cão e ele deixa de ser vadio, deixa de estar sujo e deixa de ter

fome. Até as crianças já lhe fazem festas.

Cuidaram do cão porque o cão não sabe cuidar de si — não saber cui-
dar de si é ser cão.

Ora eu não queria que cuidassem de mim, mas gostava que me

ajudassem, para eu não estar assim, para que fosse eu o dono de mim, para

que os que me vissem dissessem: Que bem que aquele soube cuidar de si!

 

*

* *

 

Eu queria que os outros dissessem de mim: Olha um homem! Como

se diz: Olha um cão! quando passa um cão; como se diz: Olha uma árvore!

quando há uma árvore. Assim, inteiro, sem adjectivos, só de uma peça:

Um homem!

 

José de Almada Negreiros, A Invenção do Dia Claro (Excerto)

 

Um poema de A.M. Pires Cabral

 

O VENTO 

 

É fácil dizer que o vento

tem gatos na voz

enfurecidos. 

 

Que afaga e despenteia,

traz a chuva. 

 

Que levanta as telhas,

exercita na noite 

os nossos mais pesados 

pesadelos.

 

É fácil ser poeta

à custa do vento. 

 

Fingir que não sabemos

que o vento não é senão

o vazio que muda de lugar. 

 

A.M. Pires Cabral, in Arado, ed. Cotovia 

Um poema de Álvaro de Campos

 

POEMA EM LINHA RECTA 

 

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cómico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado 
Para fora da possiblidade do soco;
Eu que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo,
Nunca teve um acto ridículo, nunca sofreu um enxovalho,
Nunca foi senão princípe - todos eles princípes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Quem confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Quem contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó princípes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e erróneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos — mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Um poema de Cláudia R. Sampaio.

 

Tragam-me um homem que me levante com
os olhos
que em mim deposite o fim da tragédia
com a graça de um balão acabado de encher
tragam-me um homem que venha em baldes,
solto e líquido para se misturar em mim
com a fé nupcial de rapaz prometido a despir-se
leve, leve, um principiante de pássaro 
tragam-me um homem que me ame em círculos
que me ame em medos, que me ame em risos
que me ame em autocarros de roda no precipício
e me devolva as olheiras em gratidão de 
estarmos vivos
um homem homem, um homem criança
um homem mulher
um homem florido de noites nos cabelos
um homem aquático em lume e inteiro
um homem casa, um homem inverno
um homem com boca de crepúsculo inclinado
de coração prefácio à espera de ser escrito
tragam-me um homem que me queira em mim
que eu erga em hemisférios e espalhe e cante
um homem mundo onde me possa perder
e que dedo a dedo me tire as farpas dos olhos
atirando-me à ilusão de sermos duas 
novíssimas nuvens em pé.
 

Cláudia R. Sampaio, in Ver no Escuro, ed. Tinta da China 

 

Um poema de Manuel António Pina

  
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ESPLANADA
 
Naquele tempo falavas muito de perfeição,
da prosa dos versos irregulares
onde cantam os sentimentos irregulares.
Envelhecemos todos, tu, eu e a discussão,

agora lês saramago & coisas assim
eu já não fico a ouvir-te como antigamente
olhando as tuas pernas que subiam lentamente
até um sítio escuro dentro de mim.

O café agora é um banco, tu professora do liceu:
Bob Dylan encheu-se de dinheiro, o Che morreu.
Agora as tuas pernas são coisas úteis, andantes,
e não caminhos de andar como dantes,
chamando do fundo do meu coração.
 
Manuel António Pina, in Todas as Palavras, ed. Assírio & Alvim