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Comentário: Vieira, cortar-lhe a cabeça

O Padre António Vieira, conhecido «esclavagista seletivo» tem uma estátua em Lisboa – pedem que se arranque, não por razões estéticas (as únicas que serviam) mas porque se trata de um esclavagista de primeira ordem.

 

Algumas das críticas feitas à estátua do Padre António Vieira no Largo Trindade Coelho, em Lisboa, também conhecido por «da Misericórdia», são admissíveis – por razões estéticas. Mas o que deixa derretida de fúria uma a associação intitulada Descolonizando, o problema é, digamos, o conjunto: o pobre Vieira, «imperador da Língua Portuguesa»; a estátua em si mesma, como conceito; a estátua em si mesma, de novo, mas como exemplo de «estatuária»; o símbolo de Vieira como elemento propagandístico do colonialismo e do fascismo (ou seja, «monumentos e outras celebrações racistas do imperialismo e colonialismo em Portugal»); a Companhia de Jesus; e talvez a obra do próprio Vieira, mesmo sem se cuidar de saber se o pregador era um feroz «propagador do colonialismo e do racismo», numa época em que os conceitos não existiam. Nada disso impede os protestos da Descolonizando e de (lê-se na ficha distribuída à imprensa) «investigadores, professores, artistas e activistas de diversas nacionalidades», que querem a estátua retirada de acordo com a tendência, devidamente importada – e sem tradução – dos EUA e de Inglaterra sobretudo, e que visa limpar o passado dos sinais do passado, sobretudo dos seus autores maiores. Razão porque na baixa lisboeta tivesse há tempos aparecido um grafito para denunciar o perigoso «Camões, o totó do imperialism [sic] colonial esclavagista.» A acompanhar a frase, uma suástica, como as imperativas circunstâncias (e o oco occipital do autor do grafito) exigem.

É claro que, tanto no caso de Camões como no de Vieira (considerado estupidamente um «esclavagista  seletivo») – como no de Diogo do Couto ou Fernão Mendes Pinto, para abreviar, mas a lista pode estender-se até ao Pinhal de Leiria que serviu para construir navios que por sua vez serviram para expandir o colonialismo racista – não interessa aos justiceiros estudá-los ou situá-los no seu tempo, mas arrematar uma bandeira e colar-lhes o labéu de criminosos. Eça era um machista (era), Camilo um miguelista (não era) e, se não me engano, a Língua Portuguesa um trapo fascista (com certeza). Vamos para bingo. F.J.V.