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Diogo Pires Aurélio e Maquiavel: «Maquiavelismo é o que dizem de Maquiavel os seus adversários »



Diogo Pires Aurélio, professor na Universidade Nova de Lisboa, é o coordenador da colecção Clássicos da Política (Círculo de Leitores), que já publicou Platão (O Político) e Cícero (Tratado da Repúbica) e incluirá Maquiavel, Espinosa, Richelieu, Marx, Burke ou Fichte. Diogo Pires Aurélio, que é também assessor do presidente da República, declara-se admirador de Maquiavel e é entrevistado no próximo número da LER. Um extracto:

«O que o interessa mais em Maquiavel?
O estilo. Quando digo estilo, não me refiro apenas à roupagem com que as ideias se apresentam e que faz de Maquiavel um clássico. Refiro-me à vibração que transparece em cada uma das suas narrativas e em cada uma das suas frases, todas animadas por um ritmo, uma imaginação sensorial que nunca é pastosa, pelo contrário, mantém o leitor permanentemente em sobressalto. Porque há um Maquiavel soterrado por debaixo dos milhares de traduções apressadas e interpretações enviesadas. Quem se der ao trabalho de raspar todas essas camadas de entulho e for ao próprio texto, descobre a maravilha que é um autor a pensar a política, tal como ela é, a partir do bulício da rua. Ao lado dele, toda a história do pensamento político tem um ar de medicina para anjos, os quais, como se sabe, não têm corpo.
É sempre necessário distinguir Maquiavel do «maquiavelismo»?
Convém, até porque o «maquiavelismo» se confunde com aquilo que dizem de Maquiavel os seus adversários. E não são poucos, como se sabe, tanto os teólogos da velha guarda, que o abominam mas copiam – veja-se Richelieu! –, como essa espécie de adventistas do sétimo dia que actualmente nos asseguram que há um mundo sem conflitos, sem estados e sem poder, à nossa espera, um mundo que as Nações Unidas vão decretar amanhã, ou que a multidão há-de implantar depois de amanhã. Ao criticar Savonarola, esse fundamentalista que incendiava Florença com os seus sermões, Maquiavel estava antecipadamente do outro lado, do lado dos que vêem na política o único remédio para regular a coexistência entre indivíduos e povos, coisa que será sempre difícil e arriscada.»